domingo, 30 de março de 2008

"NINGUÉM É SUJEITO DA AUTONOMIA DE NINGUÉM" - (NEM DA IDEOLOGIA?)

Pedagogia da Autonomia? Será mesmo??
Quanto aos "saberes necessários à prática educativa", Paulo Freire expõe, mais uma vez, sua consagrada visão por meio de discurso nitidamente contrário ao pensamento (malvadez) neoliberal, reivindicando oportunidades para os "esfarrapados do mundo". É a proposta de socialização do ensino. Seu ponto de vista é o dos "condenados da terra". Opõe-se, entretanto, a extermismos.
Freire apela à ética universal do ser humano para dar suporte a sua tese de que o amor à verdade, a começar no ensino, é o modo de reversão da realidade nefasta político-social a que todos estamos sujeitos.
Parece-me crítico, todavia, condicionar o preparo de docentes tendo como referencial a retidão ética, haja vista a moderna relativização comportamental socialemente aceita.
O autor se encarrega de salientar que os saberes por ele apresentados atendem a necessidades de educadores progressistas e conservadores, independente de opções políticas, o que é altamente desejável.
A essência do pensamento construtivista está exarada no postulado no qual Freire destaca que o docente, desde o início de sua formação, deve compreender que o "ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção".
Hoje, partilho desse posicionamento, haja vista ter sido alvo desse processo, em outras oportunidades, como discente. De fato, ensinar tornou-se um empreendimento que, para ter sucesso, deve sujeitar-se à efetivação de um "contrato de objetivos" entre docente e discente.
Daí, o ato de ensinar exigir, a princípio, segundo Freire, rigorosidade metódica; pesquisa; respeito aos saberes do educando; criticidade; estética e ética; coerência entre discurso e ética; capacidade de assumir riscos; aceitação do novo; rejeição à qualquer forma de discriminação; reflexão crítica sobre a prática; e, finalmente, reconhecimento e a assunção da identidade cultural.
Neste sentido, ensinar adquire contornos de produto inacabado e de exigências de condicionamento; de respeito à autonomia do ser educando; de bom senso; de humildade, de tolerância e de luta em defesa dos direitos dos educadores; de alegria e esperança; de convicção de mutabilidade possível; e de curiosidade.
Ao partilhar sua opinião de que ao educador compete, por honestidade, expôr seu posicionamento político, o autor tende a induzir, perigosamente se mal interpretado, a necessidade de certo proselitismo protagonizado pelo professor. É a porta aberta para a deletéria pregação ideológica no ambiente acadêmico, e que, sobretudo, é passível de vício de imparcialidade.
Mais que uma especificidade, pode-se afirmar que ensinar é uma necessidade, uma peculiaridade humana. Além do ser divino, só nós podemos exercitar a atividade que pressupõe inteligência e, também, a exigência de segurança; de competência profissional e generosidade; de comprometimento; de compreensão do alcance e do papel da educação; de liberdade e autoridade; de espírito de decisão; de saber escutar; de reconhecimento ideológico da educação; de disponibilidade para o diálogo; e de querer bem aos educandos.
Nisso, o educador desempenha um papel de líder, de guia na busca e construção do conhecimento.
Ressalte-se a honestidade do autor, em reconhecer em sua obra, o caráter ideológico da educação. Em sua tese, essencialmente contrária ao discurso fatalista neoliberal, percebe-se a complexidade do papel da atividade de ensino, sobretudo na possibilidade de conformação das mentes que se mostram acessíveis à espúria exploração ideológica. Insisto nisso! Há risco aqui! A instituição de ensino torna-se, neste momento, vulnerável, qualquer que seja o enfoque.
A obra é politizada e, por isso mesmo, polêmica. Paulo Freire, com toda a liberdade e coragem, discorre sobre suas convicções no preparo de educadores, estabelecendo certo referencial que, inclusive, vai ao encontro do que pensam alguns dos integrantes da atual cúpula dirigente.
Destaco, por fim, que seria interessante que os saberes expostos por Freire fossem, de fato, aplicados no processo educacional brasileiro, para que a essência de sua idéias, que primam, acima de tudo, pela justiça social, possam, de modo efetivo, alcançar os "excluídos"por ele defendidos, vigorosamente.
Fonte: Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire, Ed Paz e Terra 2007.

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